O hábito como estratégia
Coincidência ou não, nos últimos meses tenho sido impactada com inúmeras leituras sobre “hábitos”. Desde que fui mãe, escuto com regularidade: “É muito importante manteres os hábitos e rotinas do bebé, irá sentir mais segurança”. A verdade é que esta ideia foi reforçada quando ao ler um livro sobre branding fui impactada pela história do “patinho feio” e como nós desejamos histórias que já nos são comuns.
À primeira vista, isto poderá não fazer sentido. Mas a verdade é que na última formação sobre Ecommerce e Redes sociais surgiu algumas dúvidas sobre o hábito como estratégia no digital junto de alguns alunos. Por isso, hoje vou tentar sintetizar como é que o hábito pode ser usado como estratégia em várias áreas do nosso negócio.
Mas afinal o que é um HÁBITO? Os hábitos são como “atalhos mentais” apreendidos com a experiência. Se repetido inúmeras vezes pode tornar-se automático (sem esforço). Ao contrário do que muitos pensam, os Hábitos não restringem, trazem liberdade. Porque uma escolha que anteriormente exigia esforço, agora tornou-se automática.
O Hábito tem de ser VISIVEL
A primeira vez que fui impactada pelo “hábito”, foi quando numas férias de verão (para ganhar um dinheiro extra) fui fazer reposição de champôs num supermercado. O Objetivo era criar um novo posicionamento dos champôs no supermercado, porque a marca queria perceber se o cliente efetivamente tinha interesse pelo produto, ou se já estava habituado a ir aquele corredor comprar.
Foi aí que também aprendi que as marcas mais relevantes (coca cola e afins) pagam mais para estar na prateleira ao nível do nosso olhar ou nos topos do corredor. Na nossa mente as marcas com mais relevância, são aquelas que habitualmente vemos com mais predominância.
É por este motivo que para criamos um hábito, ele tem de ser VISÍVEL. E isso acontece no digital. Já pensaram que o que é mais relevante numa newsletter é o topo da newsletter? porquê? porque é a primeira coisa que vamos ler e isso é que vai determinar se andamos com o cursor para baixo, para continuar a ler. É por esse mesmo motivo que muitas empresas usam a estratégico do INVISÍVEL a ser favor, colocando o botão do unsubscribe ou cancelamento muito pequeno ou difícil de alcançar. :P
O Hábito pressupõe a “antecipação” de uma recompensa. Por isso sofremos com as notificações do instagram ou do gmail. A verdade é que a internet é como uma droga. Publicamos algo e 5 segundos depois já estamos a fazer atualizações para ver a resposta, os likes, as visualizações. Esta ansiedade vem da conexão com as pessoas, porque vivemos de estímulos.
Estas aplicações estão pensadas para isso mesmo, criar ANSIA de abrir a “recompensa”. Algumas estratégias de design criaram produtos que acentuam esta ansia do hábito, alguns exemplos:
O Botão com o Alerta
Dizer que alguém está a escrever
As atualizações das APP
Feed Infinito
Está tudo pensado para ver “viciante”, já tinha falado disto aqui: “A internet das coisas” e “Quero o meu algoritmo de volta”
O Hábito tem de trazer RECOMPENSA
No livro Força do Hábito descobri que o hábito é usado como estratégia na construção de produtos. E é muito fácil de entender. Só sentimos que a nossa casa está limpa, se sentirmos o “cheiro a lavado”, ou só temos a sensação de cabelo lavado se o champô tiver muita espuma, ou só temos a sensação de dentes lavados se a pasta dos dentes nos der a sensação de frescura.
Estas sensações são criadas em laboratório. Nos USA, para criarem o hábito de lavar os dentes junto da população, os produtores da Pepsodente introduziram a sensação de frescura. A frescura em nada acrescenta à capacidade da limpeza, mas nós precisamos de “sentir” algo para criarmos esse hábito. Ou seja, o hábito tem de trazer recompensa. Está comprovado que começamos a sentir “prazer” antes do acontecimento. A dopamina (A dopamina é uma substância química neurotransmissora ligada ao prazer, à alegria e ao bem-estar) é ativada antes e durante a ação.
É por isso que as empresas gastam milhões a criar “pontos de prazer”. Vejamos, se estiver num país estrangeiro e se não conhecer nada, recorro a um MacDonalds. Porquê? Porque sabemos “antecipadamente” ao que ele vai saber. Sabemos como será a crocância das batatas, como será o ponto da carne. Até antes de saborear, conseguimos saber como será o sabor. Sabiam que até a quantidade “perfeita” de ml do refrigerante é pensado?
O Hábito traz SEGURANÇA
Foi feito um estudo que indicava que os filmes de maior sucesso, usavam sempre o arquétipo do Herói na sua base. A história do Super-Homem ou da Cinderela têm uma narrativa semelhante ao “Patinho Feio”. Ambas as personagens são vistas como “figuras” sem carisma, que após “rasgarem” a sua roupa ou seja os aspetos externos, conseguiram encontrar o seu verdadeiro interior.
Se os realizadores não entendessem a importância da “mudança de roupa” nesta história do patinho feio, nunca teríamos o Clark Kent na cabine telefónica ou os trapos da Cinderela transformados pela fada num belo vestido de baile :P
As histórias mais marcantes, incluem sempre um arco de “padrões narrativos” que projectam o desenvolvimento do caracter interior e o status quo da mudança — um sentimento que reflectem o desejo de um indivíduo ou de toda uma cultura. Nós reconhecemos e aceitamos estes conceitos porque eles são maiores que o produto, são como um reconhecimento interior, que nos traz segurança. Quase como se conseguíssemos antecipar sentimentos.
O Hábito traz CONFIANÇA
É fundamental entendermos a mente das pessoas e o que é que as leva a agir de uma determinada forma. Ao construirmos o nosso ecommerce, o que é que as pessoas esperam? O cliente carrega neste botão, o que vai acontecer?
Quantas vezes efetuamos um pagamento online e não acontece nada? Não recebemos email de confirmação ou uma pop up a confirmar o pagamento?
Claramente temos ansia pela previsibilidade, por isso quando a marca não “executa” um ritual a que estamos habituados, bate-nos a insegurança.
Quando as marcas são consistentes e previsíveis sentimos mais segurança, porque sentimos que a marca não nos vai falhar. Na vossa estratégia de marca têm de ser PREVISÍVEIS, pois estarão a dar ao cliente a sensação de segurança e irão ajudá-lo a tomar decisões.
Uma amiga partilhou que se habituou a ir ao site da Zara à 5ª feira ver a nova coleção, porque ela sabe que a Zara não vai falhar na apresentação de novidades. Várias empresas anunciam o dia do lançamento da sua drop criando um compromisso com os seus clientes. Por exemplo: a Anine Bing lança a sua drop todas as 3ªs feira às 9:00 e a Sézane lança todos os domingos. Estas marcas, para além de estarem a criar um compromisso com o cliente, prometer uma entrega, garante a fidelização e por consequência um hábito.
É engraçado pensar que comecei este artigo a falar da segurança dos bebés e termino a falar da segurança no online. Seja que hábito for, ele não produz apenas um resultado expectável, ele traz confiança em nós e na nossa marca. Para isso, um hábito para ser alcançado com sucesso, ele tem de fazer parte da nossa identidade, porque segundo James Clear “Quanto mais repetimos um comportamento, mais reforçamos a nossa identidade”. E isso dará um novo artigo. :-)
Bom Regresso ao Trabalho!
Joana