A globalização trouxe uma homogeneização que já não nos permite perceber de onde são as pessoas ou as coisas, por isso é urgente voltar às origens, e se ligarmos tudo isto ao desejo de consumirmos menos, mas melhor, podemos estar perante o novo conceito — o ‘Native Chic’.
Se a tendência nos convida a fazer uma re-descoberta na forma de ser sustentável, a origem é quase obrigatória neste processo. Onde trabalhar os materiais naturais, privilegiar o local e o know-how do artesanato, permite-nos criar objetos com uma identidade única e duradoura.
Sempre me intrigou o facto do ‘handmade’ muitas vezes resultar num objeto que só valoriza a técnica, e não a estética. Portugal viveu (e ainda vive) neste marasmo. A falta de cultura visual, de design e de comunicação sempre desvalorizou o saber fazer português.
Hoje o mercado caminha para uma estética onmi-cultural que mistura o antigo e o futurista, promovendo uma nova criatividade, vejamos o caso da gigante IKEA que convidou 10 artistas africanos para desenvolverem a linha Överallt, onde é possível ver cestos feitos de tranças de cabelo, têxteis com referência a paisagens africanas, tapetes feitos de embalagens recicladas. Já a Netflix está presente em 190 países. O processo de desenvolvimento da empresa concentra-se em conteúdos de “tradução global”, como é o hit brasileiro 3%. Fiquei-me pelo 3o episódio, mas vale apena!
Se estas gigantes estão a promover o onmi-cultural, a verdade é que em escalas mais pequenas temos o mesmo fenómeno. Na verdade só desejamos uma roupagem diferente que descole a técnica do look tradicional. Vejamos o caso de Nannacay, da Cult Gaia ou da Heimat Atlantica em parceria com a japonesa Comme des Garçons que através da introdução de cor, de humor e de uma nova comunicação, permitiram tornar a cestaria uma pop-culture.
No vestuário temos o caso da nova-iorquina Ulla Johnson que integra bordados finos e técnicas artesanais nos seus vestidos e que assume a inspiração SS19 “earthy palette”, ou a marca dinamarquesa By Malene Birger que acabou de lançar uma linha de acessórios em parceria com a mexicana Caralarga.
Se “a moda é um reflexo cultural e conceptual de um estilo de vida” como referi aqui: o fenómeno “Native Chic” passa por vários setores, desde a moda à música. Vejamos a dica fantástica da Francisca, com o caso do novo álbum de Rosália “El Mar Querer” que traz uma nova abordagem ao flamengo, porque afinal também se pode triunfar internacionalmente na Lingua espanhola. Digamos que nunca fez tanto sentido dizer “debajo del mar” em vez de “under the sea”.
Nativo significa ‘o que está na origem’, por isso o projeto ‘Saber Fazer’ de Alice Bernardo é paragem obrigatória. Destaco alguns produtos portugueses que para mim representam o “Native Chic”:
a Round Bag da Toino Abel em parceria com a Reality Studio que traz um look renovado da cestaria portuguesa. Brevemente irá ter uma parceria com a Taste of Portugal, fiquem atentos.
a Bia da Cinco-Store, trazendo para o mercado as famosas correntes de malha de corda oca das nossas mães e avós, agora com uma nova comunicação e look.
a Berber Candle da Anna Westerlund com a introdução de uma nova estética à cerâmica portuguesa, conjugando tecidos e missangas.
o Ocean Tapestry de Vanessa Barragão, trazendo o fundo do mar através da técnica da tapecaria.
Claramente alguns exemplos da melhor representação do saber fazer português, com uma estética que valoriza a técnica e coloca Portugal num outro patamar.
James Altozano (aqui) diz algo super interessante. Durante anos a história para ele era tudo o que estava fora de Espanha, os seus ídolos eram de vários países, mas tinha-os conhecido sempre em inglês, se o olhar para dentro é urgente, “será o Native Chic o veículo possível para a intelectualização e valorização da cultura popular?”
Só me ocorre o http://poplar.pt/ da Joana Carneiro e da sua dificuldade em encontrar registos históricos sobre a cultura Popular portuguesa e a forma genial como trouxe este assunto para a contemporaneidade dos dias de hoje.
Obrigada Francisca por toda a discussão e partilhas! Tudo isto em português.
Joana