A Morte do Stock, welcome Made To Order!
“O negócio moda está mal desenhado!” Repetiram isto 3 vezes no ‘O Futuro da Moda’ promovido pela APICCAPS. A reflexão de hoje era sobre moda inclusiva, mas rapidamente passou para a “economia das minorias”, a “escuta ativa”, o “poder do digital” e por fim a “morte do stock”. Este artigo é uma avalanche! Ready?
Há 3 semanas partilhava com o Luis que tinha escutado um podcast sobre o “new size” da Good American e nesse mesmo dia fui notificada com o new size da marca de calçado LR. Fiquei intrigada! O mercado de moda impõe-nos tamanhos, cores, tudo baseado na dita ‘tendência”, até que Emma Grede fundadora do Good American percebeu que o size que estava a comercializar não estava a ir ao encontro das necessidades das suas clientes. Percebeu inclusive que entre o número 14 e 16 existiam uma panóplia de números nunca antes explorados. Desafiou os seus designers e desenvolveu o número 15, actualmente o bestseller da marca. A Joana Barrios no programa ‘O corpo feminino e a moda’ explica bem este fenómeno. O mercado efetivamente impôs-nos uma shape e um size, mas muitas vezes não encaixamos no “padrão”. Existe por isso, uma oportunidade para a economia das minorias e o poder da cauda longa faz a cada vez mais sentido. Já leram este livro?
Vejamos, Emma deu o passo para a mudança por fazer ‘escuta ativa’ ao seu publico e a semana passada a Ana Roncha falou-nos do “shadow committee” da Gucci. Vamos lá falar sobre a escuta ativa!
Pois bem, não sei se já repararam mas a Gucci tem tido um crescimento gigante nos últimos anos, a casa de luxo italiana teve uma reviravolta notável desde 2015 e tudo deveu-se à entrada de Alessandro Michele - diretor criativo da marca. Li num artigo que não existiu uma fórmula mágica, simplesmente existiu uma mudança na cultura da empresa. Parece fácil, mas não é! O objetivo era garantir que todos se sintam à vontade para propor novas ideias e identificar processos que não estavam a funcionar. Uma maneira de fazer isso era criar o chamado “shadow committee” com uma abordagem de baixo para cima. A tarefa deste comité é “discutir os mesmos tópicos que discutimos com os executivos e dar ideias sobre diferentes processos.“ A forma como a empresa corta o couro para as suas malas, por exemplo, estava a produzir muitos resíduos desnecessários. "A outra coisa que tentamos fazer é começarmos a fazer almoços com pessoas abaixo de 35 anos", afirma Bizzarri. “Peço-lhes que indiquem três ideias sobre o que devemos fazer para melhorar a vida na Gucci.”
Informação é poder, por isso dar voz ao cliente é fundamental! É ele que sabe o que quer e como quer receber, é aí que entra o novo tópico — o poder do digital. No Fashion Sustainable Talks promovido pela Catalyst no Stylista falamos sobre o desperdício e a forma como podemos tirar partido do digital, foi aí que a Joana Silva da @conscious_swimwear disse que antes de lançar a sua coleção de bikinis perguntou às clientes que número usavam, produzindo de acordo com o solicitado. ‘Eu não tenho espaço para guardar stock, eu produzi o que o meu publico queria comprar.” Claramente informação é poder, por isso tal como acontece com os tamanhos (Sizes) o mercado também nos impõe produtos que ninguém quer comprar. Como não vendemos, seguem-se os saldos e vendemos ao desbarato — é verdade “O negócio moda está mal desenhado!”.
Em 2015 fiz o primeiro Meet The Maker com o tema ‘A costumização como um novo luxo em Portugal” e tal como já tinha referido neste artigo, Portugal não tem de competir pelo preço, mas sim pela qualidade. No meu painel tive o Gonçalo Cruz da Platforme. A Platforme estava a dar os primeiros passos no mercado internacional e eram apenas 3 funcionários. Discutimos o serviço à medida e o impacto que isto tem junto do cliente final, poderão ler tudo aqui. Vendo de fora, este Meet veio cedo demais. A sorte é que o Gonçalo Cruz voltou a sentar-se desta vez no painel ‘O Futuro da Moda’ da semana passada. Hoje já são 80 funcionários e a sua tecnologia já está implementada na Gucci, Karl Lagerfeld e Chanel. Neste mesmo painel esteve o Rafic, fundador da marca de calçado Undandy. Com uma faturação crescente, em 2019 a Undandy prevê faturar 10 milhões de euros. A marca afirma que fazer à medida, evita o stock e por sua vez o desperdício. ‘Parem de impingir ao cliente produtos que ele não quer!”, “Ninguém quer vender o seu produto mais barato”, reforça Rafic. O verdadeiro desafio está na mudança gigante que a indústria tem pela frente, e passar da economia de escala de um para um.
Uma das perguntas do publico maioritariamente industrial foi:
— “Como podemos ser sustentáveis com esse modelo, se temos 100 funcionários? “
— “Certamente os 100 funcionários ganham o salário mínimo (600 euros) e nesta nova lógica os funcionário ganhar 1500€ ou mais. O que acha ser mais justo?” respondeu o Gonçalo.
“A palavra mais suja desta industria é o Inventário”, afirma Gonçalo e Rafic vai mais longe “Posso-vos dizer que 75% do que fabrico não é costumizável? O segredo está no “Make to Order.” Porquê? porque a informação é poder e ele sabe antecipadamente o que o cliente quer, sem ter de criar desperdício. Reforça ainda “Pela primeira vez vou abrir uma loja cujo objetivo não é vender, se fizer zero vendas fico feliz”. Lembram-se dos novos desafios do retalho? já escrevi sobre isto aqui.
Se o Futuro da Moda passa pelo “Make to Order”, com salários mais justos, menos desperdício, um produto mais ajustado às nossas necessidades, não será isto a verdadeira “moda inclusiva?”.
Joana