Passaporte Digital de Produto

Ao longo dos últimos anos, várias entidades desenvolveram o seu passaporte digital. De forma a não perder o rumo e com a lei quase a entrar em vigor, a União Europeia criou uma entidade que uniformiza a informação do espaço europeu. A ideia é encontrar pontos comuns de forma a lançar uma versão mais simplificada e de fácil implementação. O passaporte surge como uma forma de tornar transparente a cadeia de valor moda. O objetivo é dar mais informação ao consumir final sobre a forma como fazemos produtos, a fim de influenciar na sua decisão de compra. Reuni com a equipa do CITEVE para perceber o que Portugal está a fazer.

Em Portugal, quem está atuar?

Várias empresas já têm passaporte digital (próprio ou com parceiros), no entanto, o CITEVE está a liderar a digitalização da cadeia de valor do setor têxtil e vestuário em Portugal por via do STV go Digital.

O que estamos a rastrear?

Fiz um esquema para entenderes melhor. No STV go Digital, a rastreabilidade acontece a partir do momento em que o fio entra em Portugal e vai até ao consumidor final (retalho). Tudo o que está para trás (importação de matéria prima) e para a frente (pós consumo) não está mapeado.

Sabemos que um dos grandes impactos da indústria da moda está precisamente aí. Na compra da matéria prima e na forma como descartamos a roupa.

Lembras-te destes artigos? “De onde vem o nosso algodão?”, “o Lixo é vestível?

Nesta primeira fase, o CITEVE vai buscar os dados das matérias primas via software LCA com informação standard e o pós-consumo ainda não está a ser analisado. A fase 2 e 3 (representado no gráfico) será feito no futuro próximo no âmbito do BE@T - Bio Economia da Têxtil.

O que é o passaporte europeu?

O passaporte digital irá ser obrigatório a partir de 2024/25 para 3 sectores numa primeira fase: eletrónica, baterias e têxteis. Ele tem como objetivo rastrear a cadeia de valor de forma a aumentar a consciência do consumidor no momento da compra.

A quem se aplica?

Segundo António de Sousa Maia, responsável pela Estratégia da EU em prol da Sustentabilidade e Circularidade dos Têxteis. “O ESPR Ecodesign for Sustainable Products Regulation (e o seu DPP) é legislação relativa a produtos (da nova abordagem) e portanto aplica-se a todos os produtos colocados no mercado da UE, independentemente do local de produção ou de origem dos componentes e matérias primas. Os requisitos serão assim idênticos para todos os produtos colocados no mercado da UE e apenas a forma de controlo diferirá porque o controlo para produtos importados é feito inicialmente no controlo alfandegário. A UE propôs recentemente um novo pacote legislativo alfandegário para melhorar os controlos. Os controlos subsequentes (após colocação no mercado) serão idênticos. O responsável por produtos importados é o importador, equiparado ao produtor europeu.”

Quais são os critérios do passaporte?

Apesar de ser um tema ainda em discussão, o DPP irá considerar:

  • Durabilidade,

  • Circularidade,

  • Reciclabilidade

  • EcoDesign,

Critérios esses que também estão a ser considerados no passaporte digital de produto STV go Digital organizados em:

  • Ambiental + Circularidade

  • Económico + Social

Como visualizamos a informação?

No STV go Digital o Score apresentado considera a combinação dos critérios referidos acima e apresenta a informação de 3 formas:

  • Um semáforo de A a F com cor de verde a vermelho

  • Uma percentagem de 0 a 100%

  • Um roadmap pelas empresas por onde passou

Passaporte Digital STV go Digital

Qual é o benefício real?

Tentar encontrar uma linguagem comum a outros sectores foi o caminho escolhido pelo CITEVE. No entanto, classificar a moda, como os eletrodomésticos ou a alimentação não pode ser visto da mesma forma. Este tipo de semáforo pode induzir em erro o consumidor final. Porquê?

Etiqueta de Eletrodomésticos

Etiqueta Nutricional de Alimentos

  • A legislação comunitária acabou com as classes A+, A++ e A+++ das etiquetas de vários eletrodomésticos, passando a etiqueta a ostentar uma escala mais simples de interpretar, de A (mais eficiente) a G (menos eficiente). Com esta classificação sabemos que estamos a visualizar um benefício energético, que afeta diretamente a minha fatura da eletricidade. Quanto mais verde, mais estou a poupar.

  • Ao visualizar a etiqueta nutricional eu visualizado o benefício da saúde. Quanto mais verde, sei que o produto é mais saudável.

  • O CITEVE optou por complementar o Semáforo com uma % do produto. Na moda não estamos a classificar apenas o impacto ambiental, estamos também a classificar o impacto social. Podemos ter um produto com uma matéria prima sustentável, mas ter um tingimento químico tóxico ou ter falhado no pagamento aos funcionários.

Indo mais além, quando estamos a falar em moda, estamos a falar de um consumo emocional. O passaporte pode influenciar, mas é só se o produto garantir os primeiros benefícios percepcionados pelo cliente.

Sentimento do consumidor x comportamento

Apesar dos consumidores terem consciência e terem a intenção de comprar mais sustentável ​​– particularmente a Geração Z – os dados indicam o contrário sobre essa intenção / sentimento em termos de mudanças de comportamento de compra.

No relatório realizado pela thredUP alusivo a 2023, vemos que o preço e a percepção de qualidade são sempre a prioridade. A transparência é o último passo.

A sustentabilidade nunca está no TOP de prioridades. Hoje em dia temos muito mais consciência, no entanto, como consumidores, da consciência à compra vai um passo gigante. Queremos uma moda mais sustentável, mas não significa que estejamos a comprar por esse fator.

O que significa na prática?

O custo para implementar um passaporte digital é enorme e a verdade é que esse valor terá de ser imputado ao valor do produto. Por outro lado, já vimos que o consumidor não compra por ter uma “etiqueta transparente”.

No meu entendimento o grande benefício do passaporte digital de produto será para as empresas. Porque a partir do momento em que têm de reportar “com transparência”, irá exigir delas maior verdade, obrigando-as a uma transformação interna.

Quão transparentes queremos ser? Vamos identificar o nome das empresas ou iremos apenas identificar territórios?

Segundo António de Sousa Maia “O tipo e o nível de detalhe da informação exigida está a ser discutida no grupo de trabalho de preparação do ESPR DA para têxteis. Terão de ser requisitos necessários e proporcionais aos objetivos de proteção do ambiente e não poderão violar propriedade intelectual e informação confidencial. O nome da empresa será certamente parte dos "identifiers".

As marcas têm de centrar os seus esforços nos benefícios do fast-fashion e transferir esse valor para o seu produto e serviço sustentável. A mudança de comportamento de consumo não vai acontecer pelo passaporte digital. A mudança irá acontecer quando a oferta se nivelar pelas características que o consumidor já se habituou. Mas isso dará todo novo artigo. :)

Boas Vendas,

Joana

Gostarias de avaliar a sustentabilidade da tua marca?

Anterior
Anterior

O Fast Fashion como solução

Próximo
Próximo

O algodão do futuro